Gordas são bonitas - Arte e fotos

Achei que o texto sobre a questão do padrão estético precisava de um acompanhamento de imagens que possam ilustrar essas mudanças através do tempo. Por isso fiz essa pequena seleção.

Começo com minha querida Vênus de Willendorf, seguida da Vênus de Laussel. As/os historiadoras/es chamam de Vênus às estátuas e representações femininas do período Paleolítico (que durou na Europa até cerca de 10 mil anos atrás).

No caso, essas duas representações tem pelo menos mais de 20 mil anos.

Assim como outras Vênus do período, têm características semelhantes como: seios fartos e caídos, barriga grande e quadris largos, aludindo à fartura, fertilidade, e maternidade. A região da vulva está também destacada, evocando a sexualidade.

Em ambas o rosto está coberto, provavelmente pelo cabelo, e podemos imaginar como uma simbologia que nos leva a ver uma mulher idealizada cujo rosto não pode ser visto.

A hipótese de muitas feministas é que são representações do que seria a Grande Deusa, uma divindade feminina associada à fertilidade e adorada por povos tribais, que depois daria origem a variados cultos de deusas femininas fortes ligadas à sexualidade, ao amor, à Terra, à Lua, etc, como Ishtar e Inanna, na antiga Mesopotâmia, Ísis, no antigo Egito, Afrodite, Gaia e Ártemis na antiga Grécia, e Vênus e Diana na antiga Roma.

Aqui dei um salto no tempo de alguns milênios, e fui parar na produção do século XIX, com grandes artistas do movimento impressionista como Pierre Auguste Renoir (francês, viveu de 1841 a 1919) e o pós-impressionista Paul Gauguin (francês, viveu de 1848 a 1903).

Nas banhistas de Renoir (quadro acima) podemos observar os braços rechonchudos, as bochechas grandes, as dobras da barriga, quase dá pra ver celulite na perna!

E a mulher retratada por Gauguin (quadro abaixo) não esconde sua barriga, uma barriga normal, que qualquer mulher tem.

Meus favoritos do século XX: acima uma obra de Tamara de Lempicka (polonesa, viveu de 1898 a 1980). Suas obras sempre mostram essas lindas mulheres que têm o rosto arredondado, braços rechonchudos, quadris largos.

E abaixo, um clássico de Fernando Botero (colombiano, nasceu em 1932), do qual já falei bastante no post anterior. As mulheres de Botero não são 'gordinhas', são gordas. Aqui, isso não a impede de ser vaidosa, se olhar no espelho, usar esmalte vermelho, brincos e colar de pérolas, arrumar o cabelo. Ela é gorda, ela se vê gorda no espelho, e ela sabe que é linda!

Pausa para reflexão: observando bem as três fotos de concursos de Miss, você percebe a diferença gritante entre os padrões de corpos que são colocados?

A primeira foto acima é de um concurso de Miss América de 1923: os seios podem ser meio caídos, os quadris largos, tem barriguinha saliente ali, e várias delas têm celulite, o máximo que elas usam é um pouco de maquiagem.

A foto acima já é de um concurso de Miss Universo dos anos 1950 (não achei a data exata): todas têm a cintura fina, o maiô tomara-que-caia enfatiza isso e os corpos têm formatos muito parecidos. Nenhuma delas têm celulite e todas estão bem maquiadas. Ah, 'detalhe', a Miss África do Sul (a primeira à direita) é branca! Mas poderíamos pensar que é porque eram os anos 1950. Tudo bem, observe as candidatas a Missa Universo de 2012 abaixo, a primeira da esquerda é da África do Sul, e olha só, que coincidência, ela também é branca. Tem uma candidata negra (a de cabelo raspado), mas não consigo ler o nome do país na sua faixa.

E nesse Miss Universo 2012 o que vemos? Tudo é padronizado: agora há o tamanho certo para braços, busto, cintura com barriga chapada, quadris, tudo firme, nenhuma estria, nenhuma celulite, muita maquiagem, cabelos iguais.

Mas a Miss representa o modelo de mulher saudável. Existe um outro padrão que leva essa madreza ao extremo, o das passarelas abaixo.

As duas fotos acima trazem algumas modelos das passarela, verdadeiros cabides humanos que chegam a um nível de magreza doentio. As agências de modelo começam a buscar essas garotas quando ainda estão no início da adolescência, fase em que tendemos a ser mais magras, as medem e indicam que têm que manter aquela medida de criança durante o resto da adolescência. Assim meninas muitas vezes desde os doze anos passam a controlar o peso para poder ser modelo, quando a genética as beneficia com a altura (notaram como as primeiras miss eram baixinhas e hoje em dia todas são altas?).

Muitas começam a trabalhar na adolescência, quando ainda tem esse corpo, e até largam os estudos. Aos vinte e cinco já estão velhas para essa carreira. Para as modelos de fotos o padrão não é tão rigoroso, e não precisam ser tão magras quanto as de passarela. Ainda assim, hoje as fotos passam por dez mil procedimentos que não aconteciam antes: a tradicional iluminação e maquiagem pra 'disfarçar' imperfeições, agora é seguida pelo retoque no photoshop que cria pessoas com proporções que não são reais.

O nicho que a indústria recém-descobriu das mulheres 'plus size' vem tentando ocupar isso criando modelos plus size (que eu chamaria de modelos tamanho normal...), e fazendo aquelas campanhas de produtos de beleza do tipo 'beleza real', ou 'somos todas bonitas'. Legal, boa intenção pra aumentar suas vendas. A questão é que mesmo as modelos plus size passam pelo photoshop, as mulheres das duas fotos abaixo não tem uma estria, uma celulite. Sim, são fotos de modelos consideradas plus size.

Mas cadê minha gente as Vênus de Willendorf de hoje em dia?

Eis que achei o seguinte: "O projeto EXPOSE: SHEDDING LIGHT ON COLLECTIVE BEAUTY foi criado em 2013, pelo ativista Jes Baker e pela fotógrafa Liora K com a intenção de mostrar a beleza real e comum das mulheres."

Essa fotógrafa não usa truques de maquiagem e as pessoas se voluntariam pra tirar uma foto em que possam se sentir lindas e sexy sendo quem são. Tem mulher gorda, magra, branca, preta, alta, baixa, jovem, velha, do peito grande, do peito pequeno, com pêlo, depilada, todas as infinitas combinações dessa questão que é ser mulher. Abaixo uma amostra.

Pra quem quiser cutir as fotos, fica o endereço do site, que é muito legal:

http://www.theexposeproject.com/#!copy-of-image-gallery/ckik

#feminismo